domingo, 12 de agosto de 2007

Combate ao analfabetismo

As Nações Unidas lançaram em 2003, a Década da Alfabetização, considerada um reforço à 2ª. Meta do Milênio: alcance universal da educação primária. Atualmente, 20% da população mundial não sabem ler nem escrever. Acompanhe como o Brasil vem tentando combater o analfabetismo.

A alfabetização é um processo simples, mas que leva tempo. Para um aluno ser capaz de ler um simples bilhete ou escrever seu póprio nome, ele precisa aprender o alfabeto, soletrar sílabas e reunir palavras. Os resultados, no entanto, são enriquecedores e trazem mudanças positivas, segundo professores e alunos.

Mas essa realidade ainda não é comum a todos. O senador brasileiro, Cristovam Buarque, ex-Ministro da Educação do Brasil, diz que a educação, infelizmente, ainda não é considerada fundamental no país.

“A educação não é um valor fundamental no imaginário da população brasileira, seja pobre ou seja rica. O rico gasta dinheiro na educação do filho não é para que ele seja educado, é para que ele tenha um bom salário depois de adulto. O pobre no Brasil ficou tão acostumdao a ser relegado que ele não considera a educação como algo fundamental. Um pobre brasileiro acredita que tem direito a ter um carro igual ao rico, mas não acredita que tem direito de ter uma escola igual à do rico”, disse.

A realidade das pessoas que não sabem ler e escrever não é nada fácil e a falta de expectativa de finalmente ter acesso à educação fez com que pessoas como João José de Souza, um agricultor de Mamanguape, no interior da Paraíba, arranjasse seus próprios meios de levar a vida.

“Eu nunca fui na escola, não aprendi a ler nada mas sempre fui inteligente: planto macaxeira, inhame, batata e tenho até uma casinha que eu fiz. Eu me martirizo porque não aprendi nada, mas não tem mais jeito então eu vou escapando até o dia que Deus quiser. Quando eu não sei, eu falo com o povo. Eu tenho andado por todos os cantos e nunca me perdi, aí quando tem uma pessoa mais velha, mais inteligente, eu pergunto para ele. Carta eu não escrevo para ninguém. Notícia só falando assim. Eu mando os outros lerem e eu escuto”, disse.

Quando foi inaugurada, a Década da Alfabetização, em 2003, pela Assembléia Geral das Nações Unidas, houve um grande entusiasmo de líderes governamentais em agir em seus países para encarar o problema e atingir metas de redução no analfabetismo até 2012.

Mas segundo analistas, a questão da educação no mundo requer muito mais do que iniciativas. Assim como uma boa lição, a implementação de projetos educacionais precisa de planejamento, dedicação e investimentos a longo prazo.

Segundo Cristovam Buarque, é preciso que haja campanhas não apenas de alfabetização, mas também para a erradicação dela.

“É inacreditável que em pleno século 21, o mundo ainda tenha tantos milhões de analfabetos adultos. O pior é que isso pode ser resolvido sem grandes dificuldades. Quando faz-se uma campanha de erradicação, vai-se às prefeituras, às ONGs, às igrejas, às famílias e mobiliza-se todo mundo com um prazo para concluir o trabalho. Essa é a grande diferença, a erradicação define um prazo, assim como a Década da Alfabetização das Nações Unidas. Quando isso é feito pouco a pouco, afabetiza-se menos do que os novos adultos que chegam analfabetos pelo fracasso das escolas das crianças”, disse.

Durante a cerimônia de abertura, o Diretor-Geral da Unesco, o Embaixador Koïchiro Matsuura, afirmou que "por meio da alfabetização os menos favorecidos podem encontrar sua voz”.

Para o diretor do Departamento de Educação de Jovens e Adultos do Ministério da Educação e Cultura no Brasil, Timothy Ireland, é importante mobilizar através da educação explicando como a vida, após o aprendizado, pode mudar, mas não necessariamente revolucionar.

“Mobilizar e sensibilizar as pessoas para que eles entendam que a alfabetização deve contribuir para melhorar a qualidade de suas vidas. Não pode ser uma mobilização que engana. Eu acho que a educação freqüentemente muda a vida mas não vai revolucionar, e a pessoa não vai passar a ganhar muito mais por ser alfabetizado, mas tem vários aspectos de sua vida que vão melhorar”, disse.

No Brasil, o número de analfabetos começou a diminuir somente nos últimos 20 anos. Hoje em dia, são 15 milhões de analfabetos absolutos, dos quais 3 milhões têm idade entre 15 e 29 anos.

De acordo com o relatório da Unesco, o Brasil está entre os países que estão seriamente em risco de não conseguirem atingir a meta de 80% de alunos alfabetizados nos próximos cinco anos.

Para mudar essa realidade, o Ministério da Educação conta com o programa nacional “Brasil Alfabetizado”, apoiado pela Unesco. Segundo Ireland, o programa está progredindo mas os resultados não são vistos.

“Ao longo do período de 2003 a 2006 foram atendidos mais de 7 milhões de jovens e adultos em salas de aulas de alfabetização, mas este número não se reflete na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio). A Pnad capta que o Brasil está fazendo um esforço grande mas não há uma redução que esperávamos”, disse.

O índice de analfabetismo ainda é mais alto em áreas rurais, como no Pará, o norte de Minas Gerais e a região nordeste do país, que é o foco do programa. De acordo com o MEC, a área concentra hoje 90% dos municípios brasileiros com taxa de analfabestismo superior a 35%.

Gileusa Santos, moradora de Santa Rita, na Paraíba, é um exemplo disso. Com 44 anos, ela nunca pode estudar porque era a mais velha de uma família com mais de 20 irmãos.

“Apesar de eu ser analfabeta, eu gosto de me informar. Eu sei as primeiras letras. Eu conheço as letras, só não sei formas as palavras. Eu sei quais são os ônibus que eu pego para os lugares, identifico bem assim mesmo. Eu não aprendo porque não ligo”, disse.

A Unesco chama atenção para o fato de que educar adultos não é o mesmo que educar crianças. Para pessoas que não foram educadas durante a infância, é necessário que sejam consideradas as suas prioridades durante a aprendizagem para manter o alunos interessados e engajados, como explica o senador Cristovam Buarque.

“É difícil aprender a ler depois de uma certa idade. O adulto foge de ser alfabetizado pela dificuldade. O adulto trabalha, o professor então tem uma dificuldade tremenda. Além disso o próprio processo cognitivo, a capacidade de aprender, é mais fácil numa criança do que num adulto. Por isso, o método de alfabetizar o adulto tem que chegar à maneira como ele pensa o mundo, tem que motivá-lo conforme o aprendizado dele pode beneficiar na sua vida, no dia-a-dia”, explicou.

Um aspecto simples mas extremamente importante quando considera-se alfabetização já adulta é questão da visão. Muitos adultos que voltam às salas de aula, acabam tendo dificuldades na hora de enxergar o quadro, como explica o professor Luis Antônio dos Santos, professor municipal do estado do Rio de Janeiro.

“O que eu vejo colegas reclamando é que a maioria das pessoas com mais idade têm mais dificuldades para enxergar e para entender, mas eu acho que isso são coisas que podem ser resolvidas,” disse.

Na Tanzânia, por exemplo, na década de 70, o número de alunos alfabetizaados dobrou após uma grande campanha nacional, onde mais de um 1 milhão de óculos foram distribuídos e livros e documentos começaram a ser impressos com letras maiores.

Mas o analfabetismo é apenas o primeiro problema a ser resolvido, a grande questão ainda é a quantidade de alunos que deixam a escola sem ter a capacidade real de utilizarem seus conhecimentos adquiridos na prática. Esse tipo de situação, extremamente conhecido no Brasil, é chamado de analfabestismo funcional, ou seja, alunos que foram alfabetizados mas não chegaram a completar nem quatro anos de estudos para concluírem o Ensino Fundamental e não possuem as habilidades necessárias para satisfazer as demandas do seu dia-a-dia e se desenvolver pessoal e profissionalmente.

Em todo o mundo, duas em cada três crianças não terminam os quatro anos de educação após a alfabetização. No Brasil os últimos números mostram que existem mais de 32 milhões de analfabetos funcionais, ou seja, 26% da população de 15 anos ou mais de idade.

Um bom exemplo é o uso da matemática que, apesar de ser considerada uma língua mundial, atualmente é preciso que se tenha um conhecimento da cultura ocidental para ser capaz de entender os cálculos. Nisso inclui-se a capacidade de ver as horas, calcular as estações, e fazer medidas simples.

O agricultor João explica que a necessidade de entender os cálculos fez com que ele se interessasse pela matemática.

“Conta eu sei, não faço ela mas eu entendo todinha. Essas continhas de supermercado, quando o cabra faz eu sei todinha. Eu chego em casa confiro e dá certinho. Direitinho eu confiro. Tudo que eu vou fazer, eu já sei como é que é”, disse.

O custo de educação ainda é um dos maiores obstáculos pois programas educacionais precisam ser cuidadosamente implementados e isso requer tempo.
De acordo com o MEC, até o final de 2007, R$ 300 milhões serão destinados à alfabetização de jovens e adultos no país, R$ 100 milhões a mais que em 2006.

Um preço, que pode ser alto para muitos, mas que produzirá dividendos sem valor.

Ouça esta notícia em http://webcast.un.org/radio/portuguese/mp3/2007/09August-nua-analfabetismoA.mp3

Fonte: Rádio ONU

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