"Quanto mais fiéis a Igreja Católica perder, maior será a necessidade da conquista da sua hegemonia do ensino religioso na educação pública do país. Da mesma forma, no vácuo de espaço que a perda de crentes cria, surgem as instituições pentecostais e evangélicas com a mesma necessidade de ocupar espaço na educação brasileira". A declaração é do professor da faculdade de educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Luiz Antônio Cunha, preocupado com a virada religiosa que tomou, especificamente, o ensino no estado fluminense.
Para ele, à medida que a influência do catolicismo diminui, aumenta sua pressão indireta, lembrando que a cada mês, fecha-se uma escola particular religiosa no Brasil. "O peso dessa hegemonia, que já é tão grande, tende a aumentar com as crises políticas do Brasil. A enorme mescla de partidos políticos com as instituições religiosas é prova disso. É tão visível que o Partido Republicano do vice-presidente, reeleito com alguns ministérios, é de uma direção religiosa", pontua.
Em São Paulo, a apresentação do governo do estado de São Paulo sobre o ensino religioso, aponta que ele deve ser um instrumento para "ajudar o educando a compreender-se melhor enquanto sujeito permitindo-lhe construir significados pessoais acerca do sentido de sua existência". E, de acordo com o Artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação nacional, "o ensino religioso, de matéria facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas qualquer forma de proselitismo".
De acordo com a secretaria da educação do estado de São Paulo, estima-se que 3.063 professores ministrem aulas de ensino religioso e 3.989 escolas ofereçam a modalidade, lembrando do seu caráter facultativo para o aluno. Para Valéria de Souza, da coordenadoria de estudos e normas pedagógicas da secretaria, "é impossível pensar no ensino confessional que desrespeitaria a individualidade e singularidade do aluno. Embora o título de ensino religioso tenha sido mantido, em São Paulo, buscamos compreendê-lo como ensino da história das religiões", explica.
Segundo ela, para assegurar a pluralidade e capacitar os professores habilitados ao ensino da disciplina, foi desenvolvido material em parceria com a Universidade de Campinas (Unicamp) que, em quatro volumes, procura, ainda de que de forma sucinta, cobrir desde as religiões afro-brasileiras, às orientais politeístas e às três grandes do monoteísmo - judaísmo, islamismo e cristianismo.
Adotado por boa parte do país, o ensino interconfessional tem a disciplina como resultado do acordo entre as entidades religiosas que se responsabilizarão pela elaboração dos respectivos programas pedagógicos. "A exigência do ensino religioso é federal, mas ele se difere pelos estados na forma de como é ministrado", explica Souza.
Porém, para o professor Cunha, independente do método, ainda prevalece a discussão inicial sobre a laicidade no campo educacional. "Não é possível ensinar todas as religiões em pouco tempo de aula. Porém, chegamos a determinado estado na educação, que, passamos a recomendar a metodologia interconfessional ao modelo adotado no Rio de Janeiro", conta.
Os estados do Rio e Bahia são os únicos que adotam o ensino confessional que, grosso modo, significa que sua oferta vem de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável ministrada por professores ou orientadores religiosos das respectivas religiões.
O que significa que, aproximadamente 1,7 milhão de alunos são divididos por credo durante a disciplina religiosa, a ser abordada, separadamente, por doutrinas como a católica, a evangélica, a espírita, a do candomblé ou outras que se manifestarem predominantemente na comunidade. "Porém, na prática, o resultado é bem diferente, pois cada professor da disciplina precisa de certificação de sua ordem religiosa para ministrá-la. Claramente e dada à predominância das católicas e pentecostais, resta, em suma, o ensino confessional cristão", observa Cunha.
No caso do Rio de Janeiro, a metodologia virou uma celeuma, pois, ainda na gestão de Anthony Garotinho (PMDB) sancionou-se que os professores de ensino religioso, admitidos por concurso público e certificados pela ordem religiosa a que pertençam, tenham suas licenças e cargos cassados em caso de mudança de credo ou atitude e ação que desrespeite a fé a que respondem. "No ensino religioso mistura-se o público e o privado. A religião vira artefato de doutrina no espaço público, laico e plural", condena Cunha.
Segundo Cunha, observa-se que tanto em São Paulo, quanto no Rio de Janeiro, os professores gostam do ensino religioso, pelo seu caráter disciplinatório, pois, em suma, a disciplina pontua os deveres e normas do alunado perante à autoridade professoral. "Na base, os professores acreditam que qualquer religião serve na instauração da ordem. É a réplica do manda quem pode, obedece quem tem juízo", conclui, lembrando que, em grande número de instituições o caráter facultativo da disciplina é escondido dos pais e alunos.
Fonte: Aprendiz
domingo, 20 de maio de 2007
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